É indubitável que a pandemia de COVID-19 escancarou as assimetrias existentes na
no sistema internacional de proteção à propriedade intelectual, sobretudo no tocante
ao acesso a medicamentos por países da periferia global em meio à situação de
exceção sanitária. A busca por uma vacina que neutralizasse os efeitos do novo
coronavírus tornou-se prioridade no contexto internacional. Conquanto, o que se
observou foi a imunização do centro do capitalismo e o escoamento dos imunizantes
à periferia, a qual permaneceu subordinada aos interesses comerciais da indústria
farmacêutica corroborados pelo sistema internacional de patentes. Importante arguir
que o licenciamento compulsório representa um meio de flexibilização do monopólio
patentário, possibilitando-se o desenvolvimento de versões genéricas do objeto
patenteado e, consequentemente, o maior alcance de vacinação, mas o fato é que
esta dependência tecnológica e comercial da periferia em relação ao centro precisa
ser analisada de modo aprofundado, visto que decorre de uma estrutura forjada na
manutenção do subdesenvolvimento periférico. Por isso, esta pesquisa tem como
objetivo analisar se o licenciamento compulsório da vacina contra COVID-19
realmente gera benefícios aos países da periferia do capitalismo, tomando-se como
ponto de investigação a teoria da dependência e seus desdobramentos teóricos. De
forma específica, o presente trabalho procura demonstrar que as pandemias são
inevitáveis e que a centralização da propriedade intelectual encabeçada pelo instituto
da patente é incompatível com a construção de uma dimensão de saúde global e
produz impactos significativos na saúde pública, especialmente nos países em
desenvolvimento. Para tanto, utiliza-se do método hipotético-dedutivo à luz de uma
perspectiva materialista-histórica, adotando-se abordagem qualitativa, natureza
básica, tudo concretizado mediante a técnica de pesquisa bibliográfica sob um
enfoque crítico. Por conseguinte, chega-se à conclusão de que, a partir da teoria da
dependência, ainda que o licenciamento compulsório das vacinas venha a prosperar,
a periferia de capitalismo não teria o imbróglio da subordinação aos países centrais
solucionado, uma vez que o esforço pelo desenvolvimento tardio destes países
ignorou seu passado colonial, isto é, ainda que os países periféricos encontrem-se
inseridos no capitalismo global, estes não superaram as amarras coloniais frente ao
centro, e entende-se que o regime de acumulação ocorrido nos países industriais é
estruturalmente impossível de ser por eles reproduzido. Portanto, enquanto os países
desenvolvidos possuem sua economia fulcrada na industrialização com a
concentração de inovação e tecnologia, esta não é a realidade do
subdesenvolvimento, assim, a relação centro-periferia ocasiona uma troca desigual
observada pela teoria da dependência e que se sobrepõe também na relação das
vacinas como um empecilho à garantia do direito humano à saúde.